sábado, setembro 25, 2004

192. DORMINDO AO LUME 

A minha avó tinha as mãos enrugadas e quentes, era bom adormecer ao colo dela, junto ao lume, naquela enorme lareira, onde a família se dispunha em cadeirinhas de palha, todos conversando, em tons de negro e vermelho. Os gatos, espojados, tisnavam o pêlo de tanto arrimo às brasas. Saltavam faúlhas. De vez em quando, estalava uma bolota a secar ao fumo. Eu ia dormitando, naquela modorra amiga, entre vagos ressoos de voz que ora pareciam altear-se, ora sumir-se.

Mário de Carvalho - "Outrora agoras", in JL (Autobiografia), n.º 886, pág. 40, de 15 a 28 de Setembro de 2004.


terça-feira, setembro 21, 2004

191. MARIA KEIL NA BIBLIOTECA NACIONAL 



Este foi o meu Livro de Leitura da Segunda Classe.
Claro... lembro-me bem de o meu professor (o mesmo mestre do post 188) me pedir para ler... e eu "naturalmente" comecei a ler a primeira lição: "Livro meu muito amado". O mestre vindo da parte detrás da sala deu-me um estabefe. Eu deveria ter lido o título, o nome dos autores, a editora e o preço! E não é que eu dei-lhe e dou-lhe hoje razão! E não abro um livro sem seguir à risca o conselho do meu professor.
Lembro-me bem da "Carta do Paulo ao Duarte", do "Rato do Monte e o Rato do Moinho", do "Coelhinho Branco" (- E eu sou a Cabra Cabrês que te salto em cima e te faço em três), da "Lengalenga" do galo e da galinha, de "O Macaco do Rabo Cortado", de "A História da Carochinha", de "Os Gatos Janotas", de "Uma Sessão de Cinema na Escola" (ainda não tinha visto um filme projectado), do "Piloto", de "O Amigo"... enfim...
Mas... lembro-me sobretudo das ilustrações de Maria Keil e de Luís Filipe de Abreu.
De Luís Filipe de Abreu falarei numa outra altura.
Na verdade, Maria Keil foi para mim uma paixão à primeira vista. Muito eu tentei copiar os seus desenhos. O problema era a concisão e simplicidade do seu traço.
Nos anos seguintes procurei seguir a sua obra e adquirir os livros por si ilustrados. No meu sótão dos tempos de Coimbra, tinha na parede uma reprodução feita por mim de um dos seus desenhos.
Há dias, foi com muito prazer que visitei na Biblioteca Nacional a exposição "Maria Keil - ilustradora" que decorrerá entre 9 de Setembro e 20 de Novembro de 2004. E lá estava o meu livro da Segunda Classe!

NOTA 1: Uma história curiosa com Maria Keil passada há 62 anos: "Prisioneiros da Serra sobreviveram com gelo e laranjas". Esta reportagem valeu à jornalista Liliana Garcia, do "Jornal do Centro" (Viseu), o Prémio Gazeta Revelação 2003, ao lado de jornalistas como Ana Sousa Dias e de Carlos Fino.

NOTA 2: Que grande é a blogosfera!: não conhecia os blogues Amnésia e Zoóide - também falam de Maria Keil. Aconselho a visita.

segunda-feira, setembro 13, 2004

190. CONVERSA AMENA COM OS ALUNOS 

Janeiro, 12

«O que eu quero principalmente é que vivam felizes».
Não lhes disse talvez estas palavras, mas foi isto o que eu quis dizer. No sumário, pus assim: «Conversa amena com os rapazes». E pedi, mais que tudo, uma coisa que eu costumo pedir aos meus alunos: lealdade. Lealdade para comigo e lealdade de cada um para cada outro. Lealdade que não se limita a não enganar o professor ou o companheiro: lealdade activa, que nos leva, por exemplo, a contar abertamente os nossos pontos fracos ou a rir só quando temos vontade (e então rir mesmo, porque não é lealdade deixar então de rir) ou a não ajudar falsamente o companheiro.
«Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já me esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos».
Não acabei sem lhes fazer notar que «a aula é nossa». Que a todos cabe o direito de falar, desde que fale um de cada vez e não corte a palavra ao que está com ela.


Sebastião da Gama - Diário, 6.ª Edição, págs. 25-26, Edições Ática, Lisboa, 1980.

Sebastião da Gama (1924-1952) escreveu este registo no seu primeiro dia de aulas como professor estagiário na Escola Veiga Beirão em 1948-49. Esta semana, muitos professores, estagiários ou não, esquecerão outras palavras, mas lembrar-se-ão sempre destas para o seu primeiro dia de aulas.


quarta-feira, setembro 01, 2004

189. BLOGUE SOBRE O CINEASTA ANTÓNIO REIS 


do filme Ana, 1985

António Reis (1927-1991) é um cineasta injustamente desconhecido para muitos portugueses.
Construiu uma obra singular, a sós ou com Margarida Cordeiro, sua mulher.
É essa obra que não queremos que fique esquecida.
Há muito que desejamos reunir e divulgar, num espaço acessível a todos, o que se escreveu sobre este grande realizador do cinema português, com intuito de divulgar a sua obra e despertar novos estudos.
É chegada a hora! Criámos o blogue António Reis em sua homenagem.
Colabore connosco, fornecendo-nos as informações que possuir.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

Site Meter


referer referrer referers referrers http_referer